Sexta Turma afasta in dubio pro societate na pronúncia
- Dario Silva
- 16 de out. de 2023
- 3 min de leitura
Sexta Turma afasta in dubio pro societate na pronúncia e cassa decisão que submeteu acusado ao tribunal do júri
Sexta Turma afasta in dubio pro societate na pronúncia:
Por entender que a sentença de pronúncia exige a demonstração de alta probabilidade de envolvimento do réu no crime, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
afastou o preceito in dubio pro societate e cassou a decisão que havia mandado a júri popular um homem acusado de participação em homicídio no Distrito Federal.
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In dubio pro societate e pronúncia
O colegiado superou a compreensão doutrinária – acolhida durante muito tempo pela jurisprudência –
de que, diante da desnecessidade de prova cabal de autoria para a pronúncia do acusado, esse momento processual deveria ser regido pelo preceito in dubio pro societate.
De acordo com os autos, dois homens contrataram um motorista para levá-los ao local onde mataram uma pessoa.
No processo, não surgiu nenhuma evidência de que o motorista conhecesse previamente os autores do crime ou a vítima,
nem de que ele soubesse da intenção criminosa de seus passageiros.
Houve prova, sim, de que o motorista fazia serviços de transporte habitualmente.
Mesmo assim, ele foi denunciado e pronunciado.
Dúvida
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), ao manter a pronúncia com base no preceito in dubio pro societate,
considerou indiscutível o fato de o réu ter dirigido o carro, havendo dúvida apenas quanto a ele ter ou não conhecimento de que os passageiros pretendiam cometer o crime – dúvida que, para a corte local, deveria ser dirimida pelo júri popular.
Exigência de prova deve ser maior para decisões mais graves
O relator do caso no STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, afirmou que
os requisitos necessários à submissão de um acusado ao tribunal do júri devem ser analisados sob a perspectiva dos standards probatórios (grau de confirmação que um fato precisa ter, a partir das provas, para justificar uma decisão).
Para o ministro, os standards probatórios devem ser progressivos, exigindo-se maior grau de confirmação sobre os fatos à medida que a decisão a ser tomada pelo julgador tenha consequências mais graves para o acusado.
“É preciso levar em conta a gravidade do erro que pode decorrer de cada tipo de decisão”, comentou, apontando que a abertura de uma investigação, por exemplo, é menos grave para o indivíduo do que o recebimento da denúncia.
Já a pronúncia – penúltima etapa antes de eventual condenação – é, segundo Schietti, uma
“medida consideravelmente danosa para o acusado”, pois ele será julgado por jurados leigos que não precisam fundamentar suas decisões.
Por isso, na pronúncia,
“o standard deve ser razoavelmente elevado, e o risco de erro deve ser suportado mais pela acusação do que pela defesa, ainda que não se exija um juízo de total certeza para submeter o réu ao tribunal do júri”.
Segundo o ministro,
“não pode o juiz, na pronúncia, ‘lavar as mãos’ – tal qual Pôncio Pilatos – e invocar o in dubio pro societate como escusa para eximir-se de sua responsabilidade de filtrar adequadamente a causa, submetendo ao tribunal popular acusações não fundadas em indícios sólidos e robustos de autoria delitiva”.
Dúvida sobre autoria é diferente de dúvida sobre indícios de autoria
Schietti avaliou que, no caso em julgamento, a pronúncia ocorreu sem que houvesse nenhum indício robusto para demonstrar com elevada probabilidade a hipótese de participação consciente do motorista no crime.
Para o relator, é necessário distinguir a dúvida sobre a autoria de um crime – a qual, se presentes indícios suficientes, deve ser dirimida pelo conselho de sentença – da dúvida quanto à própria existência de indícios suficientes de autoria,
“que deve ser resolvida em favor do réu pelo magistrado na fase de pronúncia“, em decorrência do in dubio pro reo.
Concluiu o ministro que
“O fato de não se exigir um juízo de certeza quanto à autoria nessa fase não significa legitimar a aplicação da máxima in dubio pro societate – que não tem amparo no ordenamento jurídico brasileiro – e admitir que toda e qualquer dúvida autorize uma pronúncia“.
Fonte: STJ
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